A Justiça Federal determinou que as empresas Vale e BHP Billiton destinem R$ 10,3 bilhões para ações de reparação em municípios do litoral do Espírito Santo impactados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG). A decisão atende a pedido das instituições de Justiça que atuam no caso Samarco: o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União, os Ministérios Públicos de Minas Gerais (MPMG) e do Espírito Santo (MPES) e as Defensorias Públicas dos dois estados.
A inclusão das regiões litorâneas capixabas entre as atingidas pelo desastre já havia sido determinada pela Justiça em outubro de 2022, mas a destinação dos valores para que as ações fossem executadas nesses municípios ainda dependia de nova decisão judicial.
Os recursos deverão ser destinados a comunidades localizadas nas cidades de Aracruz, Linhares, São Mateus e Serra, de Nova Almeida até Conceição da Barra. Desses municípios, apenas Linhares constava entre os atingidos em 2016, quando foi firmado o Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) para reparação e compensação dos danos causados pelo desastre. Contudo, posteriormente, a evolução dos estudos demonstrou que outras regiões também sofreram impactos ambientais e socioeconômicos, devendo ser incluídas entre os destinatários das ações de reparação.
Histórico - As comunidades capixabas foram adicionadas ao rol de impactados pelo rompimento da barragem em 2017, pela Deliberação 58 do Comitê Interfederativo (CIF) – colegiado incumbido de acompanhar as atividades de recuperação, compensação e reparação realizadas pela Fundação Renova no contexto do desastre de Mariana. A fundação, contudo, nunca cumpriu a deliberação, e a inclusão das regiões foi contestada judicialmente pelas empresas Vale, Samarco e BHP Billiton.
A disputa judicial foi resolvida em outubro do ano passado, quando a Justiça Federal determinou que as novas áreas entrassem na lista de impactados, atendendo ao pedido dos Ministérios Públicos e Defensorias que atuam no caso Samarco. A liminar considerou que os estudos apresentados pelo CIF para demonstrar os danos nas regiões capixabas se baseavam em conclusões técnicas e fundamentadas de órgãos públicos, com presunção de legitimidade e veracidade, enquanto o estudo contrário contratado pelas empresas não possuía o mesmo status.
A decisão desta semana, que determinou a destinação dos valores às novas áreas, adotou argumento semelhante. O magistrado da 4ª Vara Federal Cível e Agrária da SSJ de Belo Horizonte ressaltou que o pedido das instituições de Justiça está amparado em elementos técnicos que permitem concluir que o rompimento da barragem em Mariana resultou em impactos ambientais e socioeconômicos no litoral capixaba.
“Tais elementos foram produzidos pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Secretaria Executiva – Comitê Gestor Pró rio Doce e pela Fundação Getúlio Vargas, evidenciando indícios contundentes de prejuízos em múltiplas áreas e níveis na qualidade de vida do povo do Espírito Santo, atingido pelo maior desastre ambiental da história do país”, afirma a decisão.
Estudos técnicos – O pedido apresentado pelas instituições de Justiça em setembro de 2022 cita diversos estudos realizados nas áreas de estuário, costeira e marinha, que apontaram os graves danos no território capixaba, associados direta e indiretamente ao rompimento da barragem de Fundão.
Uma das análises, realizada pelo Instituto Latec em 2020, identificou concentrações significativas de Arsênio e Mercúrio em grande parte das amostras de água e solo colhidas em Santa Cruz, na cidade de Aracruz. Em relação à segurança alimentar do pescado no rio Doce, laudo pericial, produzido por perito nomeado pela Justiça Federal, apontou que o consumo de peixes dessa região é preocupante devido à presença de substâncias tóxicas originadas do rompimento da barragem de Fundão.
Além disso, monitoramento do programa de manejo de rejeitos, que atua na foz do rio Doce, em Linhares, e na zona costeira entre os municípios de Aracruz (rio Riacho) e São Mateus (rio Barra Nova), identificou o incremento da concentração de ferro, vanádio, alumínio, zinco, arsênio, cádmio, chumbo e manganês, entre outros elementos, em comparação à situação anterior.
As instituições de Justiça e o Estado do Espírito Santo destacaram ainda que a contaminação por metais pesados é apenas um dos vários impactos causados no litoral do Espírito Santo pelo rompimento da barragem. O desastre afetou o turismo, a economia e as relações sociais, tendo ocorrido o comprometimento do trabalho, a perda dos meios de subsistência e inúmeras alterações negativas da vida em sociedade.
Destinação dos valores – Pela recente decisão, a Vale e a BHP Billiton estão obrigadas a realizar o depósito judicial dos R$ 10,3 bilhões em 10 parcelas, devendo a primeira ser paga em 40 dias. O montante somente poderá ser movimentado a pedido da Fundação Renova, do Ministério Público, da Defensoria Pública, do CIF ou do estado do Espírito Santo para execução de ações nos municípios elencados na Deliberação 58.
A fundação deverá informar como será feita a inclusão dessas áreas nos projetos já em execução no Espírito Santo. Já as cidades abrangidas pela deliberação do CIF devem esclarecer o que esperam que seja implementado em termos de ações da Fundação Renova, bem como indicar soluções e um planejamento para a execução concreta dos programas no território capixaba.