Discurso na íntegra:
"Senhor Governador do Estado de Minas Gerais,
Senhoras e Senhores,
Sejam todas e todos muito bem vindos à capital da saudade, da beleza e da esperança, como a chamou Alceu Amoroso Lima.
Há exatos 70 anos, o governador Juscelino Kubitschek presidia a
primeira cerimônia na qual, desde então, Minas Gerais celebra,
em Ouro Preto, o Dia do Tiradentes e dos conjurados de 1789. A
dimensão nacional da Inconfidência Mineira, cujas projeções a
situam, de modo relevante, no contexto dos movimentos
libertários das Américas, motivou o estadista de Brasília a
estabelecer o rito que aqui parcialmente se renova. As restrições
decorrentes do combate à pandemia não disfarçam as
dificuldades que ora cercam os atos de poder que pretendam
alcançar uma praça pública.
Minguado o ritual, não deixaremos reduzir-se ou apequenar-se o
sentimento com que Ouro Preto e Minas Gerais evocam o
exemplo de Tiradentes e os sonhos dos conspiradores. Em
especial neste bicentenário da independência do Brasil,
alcançada 30 anos depois da morte do Alferes e do degredo dos
demais protagonistas, a figura clara e altiva do herói e o
sofrimento dos exilados fazem-se sentir de forma ainda mais
intensa.
É com este sentimento, que vibra nas pedras de Ouro Preto e faz
bater forte o coração, que reafirmamos a crença na liberdade, na
justiça e na democracia. O arbítrio e a ignorância não podem
prevalecer. Os ideais republicanos não serão ultrajados. Os
brasileiros, com o espírito dos mineiros de 1789 – mesmo ano
em que a Revolução Francesa assombrou o mundo –, estarão
sempre prontos para corrigir o rumo da História e recuperar a
caminhada que começa nestas ladeiras insurgentes.
Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, reaviva em nós a
consciência democrática. A primeira universidade do Brasil foi
imaginada aqui, e de novo sonhamos com o ressurgimento da
universidade. As primeiras manifestações genuínas da nossa
cultura, tal como faz cem anos reconheceram os modernistas
pioneiros, brotaram aqui, e voltamos com o mesmo ímpeto a
buscar a liberdade de expressão. Os valores da contribuição
africana aqui se impuseram e com eles queremos eliminar os
preconceitos que infestam o país. Os primeiros torturados e
martirizados da independência aqui se rebelaram, e desejamos
reafirmar na origem o nosso irredentismo.
Senhor Governador do Estado,
Ouro Preto tem sofrido as mais profundas perdas com as
injustiças da atividade mineradora, o baque econômico da
pandemia e as recentes chuvas desastrosas do longo verão. Os
pleitos da velha metrópole de Minas são do pleno conhecimento
de Vossa Excelência. Aguardamos assim a atenção que a História
recomenda seja conferida à cidade monumento nacional e
patrimônio mundial. É um símbolo de Minas Gerais que
demanda apoio e cuidado.
Que esta vinda a Ouro Preto, Senhor Governador, o retempere
no compromisso com a causa democrática e com o apelo desta
cidade síntese de Minas.
Senhoras e Senhores,
Ouro Preto escancara todas as faces da História. O ouro nos
deixou o barroco, mas o ciclo do ferro nos condena ao barraco e
nos afoga no barro. Interesses e obstáculos econômicos e o
obscurantismo político não devem prevalecer sobre as
aspirações da sociedade. Tiradentes nos legou essa capacidade
de resistência à opressão e de indignação ao império da
estupidez. Faz 180 anos, Teófilo Ottoni chegou preso a Ouro
Preto e o povo cercou a cadeia na tentativa de liberta-lo. Meio
século após a execução de Tiradentes, o líder da Revolução
Liberal de 1842 restaurava o ideário da Inconfidência. Hoje como
ontem, seguimos o rumo traçado por Tiradentes, Teófilo Otoni e
Juscelino Kubitschek.
Há poucos momentos, Ouro Preto saía em procissão para
renovar a fé. Que as celebrações da Inconfidência Mineira nos
tornem cidadãs e cidadãos renovados na esperança. Temos a
certeza de que não há outra via senão aquela que dá
continuidade à vocação de Minas para a liberdade e nos conduz
a todos ao destino democrático do Brasil.
Viva o Tiradentes!
Muito obrigado".