Os olhos do país estão
voltados para a tragédia humanitária que assola a população ianomâmi, na
Amazônia. De acordo com a Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais
e do Brasil (AMIG), por trás dessa grave situação de saúde e segurança
alimentar estão as omissões no combate ao garimpo ilegal, que teve um avanço
desenfreado na região nos quatro anos. “A AMIG repudia a atividade mineral
ilegal e as mazelas irreparáveis que isso tem causado ao país, como a que
estamos assistindo acontecer com os ianomâmis”, pontua José Fernando Aparecido
de Oliveira, presidente da associação.
Segundo ele, "já
há anos, a AMIG tem batido na mesma tecla e cobrado do governo federal o
fortalecimento da Agência Nacional de Mineração (ANM) para que tenha uma
estrutura capaz de realizar uma fiscalização digna e precisa da atividade
mineral em todo o território nacional. Essa é a única maneira de colocar um fim
às barbáries provocadas pelas operações clandestinas”, afirma.
A presença dos
mineradores ilegais tem sido uma constante, porém, nos últimos quatro anos, a
irregularidade encontrou espaço para crescer ainda mais, com o enfraquecimento
dos órgãos de apoio aos indígenas e do combate aos crimes ambientais na gestão
do ex-presidente Jair Bolsonaro. “A mineração ilegal, hoje, ocupa um território
similar ao que a mineração legal ocupa no Brasil. Essas operações clandestinas
provocam degradação ambiental indecente a qualquer custo, derrubadas de matas,
assoreamento de rios, além de pobreza generalizada, pois os empregos gerados
são clandestinos e de baixíssima qualidade; isso quando há emprego”, ressalta.
Para
o presidente da AMIG, a clandestinidade não interessa às cidades mineradoras.
“Os municípios produtores repudiam a mineração ilegal. Ela não é bem-vinda em
nossos territórios. Esse é um desserviço a qualquer cidade, uma afronta aos
cidadãos”, enfatiza.
Waldir Salvador,
consultor de Relações Institucionais e Econômicas da AMIG, chama atenção para a
evasão fiscal generalizada. “Não é só sonegação da Compensação Financeira pela
Exploração Mineral (Cfem), o garimpo ilegal não paga por alvarás, imposto de
renda, tributação do ISS, entre outros. Além de permitir todo esse absurdo, o
governo passado ainda abandonou os povos indígenas, que sofrem as consequências
dessa atividade ilegal, provocando um verdadeiro genocídio”, alerta.
Reestruturação da ANM - No início de janeiro, a AMIG enviou ao
presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao ministro de Minas e Energia,
Alexandre Silveira, uma carta de apoio e de reivindicações para tornar a
atividade mineral sustentável e benéfica para todos (mineradoras, municípios e
cidadãos). O primeiro ponto abordado é o cumprimento da Lei 13.540/2017, que
determina que 7% da receita da Cfem seja aplicada na ANM, e que até hoje não
foi respeitado.
O documento acentua que
os municípios mineradores e impactados “têm vivido de migalhas, cansados de
tentar minimizar os prejuízos com o Departamento Nacional de Produção Mineral,
falido, e com a Agência Nacional de Mineração, que já nasceu em 2017
natimorta”. “A ANM está sem orçamento, sem nenhum aporte, enquanto o lado
privado tem, ao longo desses anos, recebido o privilégio de ganhos
espetaculares – a despeito de tudo que aconteceu no país, como a tragédia de
Brumadinho, que acaba de completar quatro anos, e a de Mariana, que completou
sete anos, entre outros tantos que surgirão se esse descaso continuar”,
salienta o consultor da AMIG.
Por lei, a ANM é
responsável por fiscalizar um setor que movimenta R$ 340 bilhões por ano, o
equivalente a 4% de todas as riquezas produzidas no país. “Ela teria de ter
mais de 2 mil servidores em plena atividade. Esse é o organograma previsto em
sua criação. Porém, tem de se virar com apenas 644 servidores, o que significa
um déficit de 68,7% em sua força de trabalho”, destaca Waldir Salvador.
Em setembro de 2021, a
ANM e a AMIG firmaram uma parceria para que municípios mineradores atuassem em
conjunto com a agência na fiscalização da CFEM. Cada cidade teria uma equipe de
fiscais que seria treinada pela ANM, porém, com a falta de estrutura da
agência, o projeto também está paralisado. “Atualmente, há apenas sete fiscais
da agência reguladora para monitorar empresas de mineração do Brasil inteiro,
um imenso absurdo. A AMIG tem trabalhado para oferecer alternativas;
entretanto, se o governo federal não apoiar e olhar para a ANM, vamos continuar
a ver escândalos e desastres acontecerem”, alerta.
Promessas do novo governo - Nesta quarta-feira
(25/01), Alexandre Silveira anunciou a criação do Conselho Nacional de Política
Mineral. A intenção é ter um órgão, já no próximo mês, nos moldes do Conselho
Nacional de Política Energética, que ajude a regulamentar as mineradoras
espalhadas pelo país. O anúncio foi feito durante um congresso do Movimento de
Atingidos por Barragem (MAB), no Auditório da Faculdade de Direito da UFMG.
Segundo o ministro, a criação foi motivada por faltas de políticas públicas do
governo federal para a mineração.
“É importante lembrar que, em 2019, na época da posse, quem ouvia os discursos generalistas imaginava que, a uma hora dessas, com o fim de um mandato, o setor estaria em plena glória. Um discurso de coronel aposentado que não transformou nada na prática. Passamos por um fracasso nos últimos quatro anos. E, agora, temos a oportunidade de mudar essa história. A AMIG está disposta a lutar e a contribuir”, complementa Waldir Salvador.