Entrevista de José Fernando à revista De Fato

Em seu quarto mandato como prefeito de Conceição do Mato dentro, José Fernando Aparecido de Oliveira (MDB), mais conhecido como Zé Fernando, assumiu uma posição de destaque nos debates acerca da mineração ao ser eleito, em 2021, como presidente da Associação dos Municípios Mi- neradores de Minas Gerais e do Brasil (Amig).
Nesta entrevista, ele fala sobre um novo modelo de mineração no Brasil, cita experiências bem-sucedidas em seu município e discorre sobre a luta histórica das cidades mineradoras e o que pode ser feito para aproveitar o bom momento merca- dológico do setor mineral.
As empresas mineradoras têm tido lucros recordes devido a alta do preço do minério de ferro. Como os municípios mineradores podem aprovei- tar o bom momento do setor?
Mantendo seus planos de difersificação econômica. A mineração é finita e temos que aproveitar esse bom momento para investir e preparar as cidades para seu fim. Estamos vendo o caso específico de Itabira, onde está anunciada a exaustão mineral em dez anos. Temos que nos preparar para essa exaustão exatamente nesse apogeu, criando fundos de desenvolvimento econômico que visam a sua substituição. Temos que fazer isso agora. É como diz Churchill: “é nos melhores momentos que nós temos que fazer aquilo que é mais difícil”.
A discussão sobre mineração passa pelo desenvolvimento sustentável. Você tem um histórico muito ligado às causas ambientais. Como conciliar os interesses da mineração com o desenvolvimento sustentável e responsável?
Não dá mais para pensar em uma mineração que não integre o meio ambiente. A sustentabilidade é uma questão obrigatória em diferentes atividades, sobretudo, na extração mineral — ainda mais depois dos acidentes em Mariana e Brumadinho, que estão ressignificando todo o modelo de atividade mineral. É dentro dessa nova realidade que precisa ser construída a relação entre os territórios e a atividade mineradora. Em Conceição temos trabalhado a mineração como aliada da proteção ambiental no território. Temos, por exemplo, a rodovia MG-10, que está sendo 100% financiada pela Anglo American. Ela liga Conceição ao Serro e vai ligar os circuitos turísticos da Serra do Cipó e dos Diamantes. Com recursos da empresa também estamos fazendo o nosso aterro sanitário, o primeiro licenciado pela Superintendência Regional de Meio Ambiente (Supram) Jequitinhonha. E, dentro dele, faremos um parque ecológico. Vai resolver definitivamente o problema de resíduos sólidos em Conceição e região. São ações de sustentabilidade da mineradora. Temos outros exemplos, como o investimento no Parque do Tabuleiro, que é a maior cachoeira de Minas, para transformá-lo em uma referência para o Brasil. Agora mesmo, também por iniciativa da Anglo American, em uma parceria com o município, estamos participando de um projeto alemão de aceleração de unidades de conservação. Temos também investimentos nas áreas social, infraestrutura e meio ambiente. Estamos criando um fundo de regularização fundiária de áreas pro- tegidas para regularizarmos os parques ecológicos instalados em Conceição.
No âmbito da Amig, o que tem sido feito para orientar e apoiar as cidades minerado- ras em torno do seu desen- volvimento e independência econômica?
Estamos fazendo um convênio inédito com a Agência Nacional de Mineração (ANM) para delegar aos municípios, com capacitação e qualificação técnica, as ações de fiscalização e controle da atividade mineradora. É uma luta histórica da Amig. A ANM é o órgão regulador com a função de fiscalizar e promover a mineração, mas, infelizmente sofreu um sucateamento ao longo do tempo. Outra questão muito importante foi o aumento da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), de 2% pra 3,5%, no caso do minério de ferro. Mesmo assim, os nossos royalties continuam sendo os menores dos países produtores e exportadores de minério, se comparado com Austrália e Canadá. Esses grandes lucros da mineração estão, porém, em jazidas específicas. Então, nós da AMIG, estamos propondo a criação de uma participação especial da mineração nas reservas de grande rentabilidade. Agregando, é claro, a um fundo de diversificação econômica das cidades mineradoras. Também precisa acabar com a Lei Kandir na exportação do minério de fer- ro. Hoje, a indústria chinesa não paga o ICMS ao estado de Minas Gerais, local de origem do produto mineral. Precisamos começar a pensar o desenvolvimento da cadeia produtiva para dentro do Brasil e não para fora. Os benefícios fiscais têm que ser internos. Isso quebrou o estado de Minas Gerais e desindustrializa o país. Foi um trilhão de reais em renúncia fiscal que a Lei Kandir impôs à Minas Gerais nos últimos 23 anos, sendo que 80% dessa renúncia fiscal é sobre exportação mineral.
Em relação ao acordo de Brumadinho, em que Vale pagará uma quantia bilioná- ria como reparação ao rom- pimento da barragem Mina Córrego do Feijão, as cidades mineradora não foram escu- tadas nesse processo e elas são um dos entes mais importantes nessa discussão. O que pode ser feito para que o Governo de Minas Gerais mude os termos desse acordo para incluir as cidades mineradoras?
Nós vamos conversar com a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) no fi- nal de junho para ver se há espaço para uma proposta que contemple, no mínimo, um fundo de diversificação econômica para as cidades mineradoras. Já que nesse acordo com a Vale as cidades mineradoras sequer foram ouvidas ou procuradas para opinar, sendo que ele foi feito com recursos provenientes justamente dessas cidades as mineradoras, que ficam com todo passivo ambiental e social da mineração.